foto de Revista Ellenismos.
"Acho
que foi minha inaptidão para o diálogo que gerou o poeta. Sujeito
complicado, se vou falar, uma coisa me bloqueia, me inibe, e eu corto a
conversa no meio, como quem é pego defecando e o faz pela metade. Do que
eu poderia dizer, resta sempre um déficit de oitenta por cento. E os
vinte por cento que consigo falar não corresponde, senão ao que eu não
gostaria de ter dito, – o que me deixa um saldo mortal de angústia.
Mesmo desde guri, no colégio, descobri essa barreira em
mim, que não posso vencer. Sou um bom escutador e um vedor melhor. Mas
só trancado e sozinho é que consigo me expressar. Assim mesmo sem
linearidade, por trancos, por sugestões, ambíguo – como requer a
poesia."
"A incapacidade de agir também me mutila. Sou pela metade sempre, ou menos da metade. A outra metade tenho que desforrar nas palavras. Ficar montando, em versos, pedacinhos de mim, ressentidos, caídos por aí, para que tudo afinal não se disperse. Um esforço para ficar inteiro é que é essa atividade poética. Minha poesia é hoje e foi sempre uma catação de eus perdidos e ofendidos."
"Enquanto o mundo parir uns tipos hipobúlicos feito, por exemplo, Fernando Pessoa, resguardados pela timidez e incapazes de uma ação – as palavras não morrerão. Essas criaturas não têm outra forma de ação que em cima das palavras. Obsessiva e sadicamente as trabalha, dobrando-as até seus pés, arrastando-as no caco de vidro, até que elas sejam eles mesmos. Até que elas deem testemunho da presença deles no mundo. Quase sempre criaturas que nascem repositórios de chão e de estrelas, só sabem fabricar poesias com palavras. E ainda outras que moram ruínas viçosas por dentro, se agarram nas palavras para sobreviver."
- Manoel de Barros.
[FOTOGRAMA: 'City Lights', Charles Chaplin, 1931]
"A incapacidade de agir também me mutila. Sou pela metade sempre, ou menos da metade. A outra metade tenho que desforrar nas palavras. Ficar montando, em versos, pedacinhos de mim, ressentidos, caídos por aí, para que tudo afinal não se disperse. Um esforço para ficar inteiro é que é essa atividade poética. Minha poesia é hoje e foi sempre uma catação de eus perdidos e ofendidos."
"Enquanto o mundo parir uns tipos hipobúlicos feito, por exemplo, Fernando Pessoa, resguardados pela timidez e incapazes de uma ação – as palavras não morrerão. Essas criaturas não têm outra forma de ação que em cima das palavras. Obsessiva e sadicamente as trabalha, dobrando-as até seus pés, arrastando-as no caco de vidro, até que elas sejam eles mesmos. Até que elas deem testemunho da presença deles no mundo. Quase sempre criaturas que nascem repositórios de chão e de estrelas, só sabem fabricar poesias com palavras. E ainda outras que moram ruínas viçosas por dentro, se agarram nas palavras para sobreviver."
- Manoel de Barros.
[FOTOGRAMA: 'City Lights', Charles Chaplin, 1931]
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